Não comenta com ninguém, tá? E, se alguém perguntar, não fala que fui eu que te contei. Fofocar é um comportamento peculiar entre os humanos. Querer saber o que se passa na vida dos outros não é um costume só da vizinha fofoqueira: assumidos ou não, todos nós gostamos de uma fofoca. Prova disso é uma análise de pesquisadores da Universidade da Califórnia, que mostra que uma pessoa gasta, em média, 52 minutos todos os dias fofocando.
Hábito que passa de geração para geração na família Silva. Eva Fonseca e Silva, de 75 anos, é dona de um pequeno bazar de roupas usadas no bairro Gameleira, região Oeste de Belo Horizonte. Ela e as filhas passam horas na porta do estabelecimento da matriarca colocando o papo em dia e fofocando. Uma prática que já virou rotina. “Pelo menos três filhas ficam no bazar comigo, na parte da tarde, vendo o movimento da rua e proseando. Quando passa algum conhecido quase sempre temos alguma fofoquinha pra fazer. E a gente começa a rir depois”, confessa.
Rosangela Nonato da Silva, 55 anos, cuidadora de idosos, umas das filhas de Eva, assume o legado. “É um hábito que acaba sendo uma forma de passar o dia e descontrair. Mas não falamos dos outros por maldade. É um hábito bobo do brasileiro mesmo”, diz ela, acompanhada da filha Fernanda Nonato, 38 anos, professora infantil. Ela assume que aprendeu com a avó e a mãe a cuidar da vida alheia. “Ainda pequena me recordo da família reunida na porta da casa de algum parente comentando alguma coisa da vida dos outros. Uma mania que vai passando de geração para geração. Até meus filhos já aprenderam a fuxicar”, brinca Fernanda.
E a ciência explica o prazer por trás do ato de fofocar. Na verdade, de acordo com cientistas sociais norte-americanos, trata-se de uma adaptação evolutiva. Segundo Frank McAndrew, professor de psicologia da Knox College, nos Estados Unidos, para prosperar na época dos homens das cavernas, precisávamos saber o que estava acontecendo com as pessoas ao nosso redor. Se o indivíduo não era bom nisso, não era muito bem-sucedido.
Segundo a psicóloga Lorena Evangelista, somos conectados para nos preocupar até com a vida de pessoas famosas, que estão fora do grupo chamado de “pessoas socialmente importantes”, como amigos e familiares. “Hoje, graças à internet e às redes sociais, sabemos muito sobre artistas. Você sabe que não os encontrará, mas eles pressionam os mesmos botões em nossos cérebros que as pessoas que são importantes para nós”, diz Lorena.
Em contrapartida, quando a finalidade é só “falar mal”, a prática pode representar problemas pessoais. Para a psicóloga, autores de atitudes maldosas costumam ter baixa autoestima atrelada à “falta do que fazer”. “Geralmente são duas ou mais pessoas falando de um terceiro, e as vezes fala de cunho duvidoso, principalmente quando não há controle. Indivíduos que criticam demais têm falta de autoestima, não estão bem com eles mesmos. E também podemos citar a questão do tempo. Se tenho tempo para fofocar, subentende-se que posso não estar fazendo nada de produtivo na minha vida”, conclui Lorena.
Gostando ou não de saber da vida do outro, é preciso ter consciência de temas que podem denegrir a imagem do outro. Às vezes, uma simples conversa, aparentemente inofensiva, pode render problemas com a Justiça. Isso porque, difamar, caluniar ou injuriar é crime. E crescente em Minas Gerais. De acordo com dados do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG), de janeiro a julho deste ano foram 1833 processos no Estado por calúnia. No mesmo período do ano passado foram 1805. Já casos de difamação caíram entre os mineiros. Foram 2543 em 2021, contra 2241 de janeiro a julho deste ano.
Mas afinal, qual a diferença entre calúnia, injúria e difamação? É comum em nosso cotidiano nos depararmos com essas três palavras. Tanto injúria, quanto calúnia e difamação são crimes, previstos no nosso Código Penal, chamados de crimes contra a honra.
Em resumo, caluniar é atribuir falsamente um crime a outra pessoa. “Se eu afirmo que alguém praticou uma determinada infração e isso não é verdade, estou cometendo calúnia. Se eu falo que ela teve uma determinada conduta negativa, mas que não é considerada crime, estou difamando. Ou seja, tanto a calúnia quanto a difamação são fatos mentirosos sobre alguém”, explica o advogado Lucas Alves. Por fim, temos a injúria. “É basicamente xingar alguém. Diferente dos outros dois crimes contra a honra, a injúria resume-se a um xingamento, a atribuir termos negativos. Lembrando que todo são passíveis de detenção, de seis meses a dois anos, além de pagamento de multa”, completa Lucas.