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“PODE FALAR” da UNICEF ajuda a retirar jovens de situações de risco

O número de pedidos de socorro é tão grande que os atendentes virtuais direcionam os adolescentes, quando há fila, para o 188 que atende 24h.

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Os atendimentos do projeto “Pode Falar” são de graça e pela internet - Foto: Reprodução Pexels

O projeto foi criado na pandemia e desde o início das atividades, que envolvem a coordenação do UNICEF e várias outras instituições de ajuda às crianças e adolescentes, foram atendidos mais de 30 mil jovens entre 13 e 24 anos de idade no país, segundo os organizadores. 

Nos últimos dias, o que mais temos visto na cobertura da imprensa, principalmente no portal Aqui é a fúria de adolescentes que partem para a violência. Eles agridem colegas e até matam pais e irmãos. Um tempo sombrio, que parece demonstrar o quanto a criminalidade tem acontecido cada vez mais mais cedo no país. Para toda essa agressividade há uma série de explicações, segundo especialistas em saúde mental. 

Em geral, a maior parte está relacionada, principalmente, ao ambiente familiar, especialmente em lares problemáticos e violentos. É como uma resposta ao ambiente social onde estão sendo criados. Como se o jovem replicasse o comportamento que viu desde criança dentro de casa. 

Só no mês de março, deste ano, vimos duas grandes tragédias envolvendo adolescentes. Em Patos, na Paraíba, um adolescente de 13 anos atirou e matou a mãe, de 47 anos, e o irmão mais novo, de 7 anos, dentro de casa. A arma usada para matar os parentes é do pai, policial. Segundo a polícia, o motivo foi uma discussão por notas baixas e proibição de jogos online pelo celular. O delegado que cuidou do caso, inclusive, disse que se assustou em relação a frieza quando o jovem declarou ter se surpreendido ao ver que, mesmo após ser baleado, o pai sobreviveu. 

Crime planejado

Em Betim, na Região Metropolitana de Belo Horizonte, um adolescente de 15 anos foi apreendido suspeito de matar o pai e a madrasta. Os crimes ocorreram entre o dia 17 e na madrugada de 18 de março. Segundo os militares que atenderam a ocorrência, o jovem alegou ter cometido os assassinatos por vingança. Ele, ainda segundo os policiais, disse que não aguentava mais ver o pai bater na mãe e nos irmãos. 

O suspeito do duplo homicídio teria planejado os assassinatos, segundo a polícia. Primeiro o jovem  matou a madrasta, sabendo que ela estaria sozinha em casa. A polícia disse que fazia parte do plano envenenar a mulher. Ela chegou a beber um copo com cerveja “batizada” com veneno, sentiu certa confusão mental e reclamou do gosto amargo. O que o adolescente não esperava era que a quantidade de droga não era suficiente para matá-la. O enteado, então, deu um golpe mata-leão e esfaqueou a mulher. Com a madrasta morta na casa, o adolescente esperou o pai chegar por volta da meia-noite e o matou com golpes de marreta e enxada. Em seguida, o adolescente tomou banho, chamou a PM e confessou o crime.

Você não está só!

Casos extremos como estes poderiam ser evitados se os adolescentes pudessem contar com a ajuda de profissionais da saúde mental. Foi pensando em auxiliar os jovens em sofrimento que o projeto “Pode Falar” foi criado durante a pandemia da COVID-19. De lá para cá já foram mais de 30 mil acessos, segundo o Fundo Internacional de Emergência das Nações Unidas para a Infância (UNICEF Brasil). Ainda de acordo com os coordenadores do projeto, que tem parceria com várias outras instituições como Centro de Valorização da Vida (CVV), não é possível estimar uma média diária de atendimento porque isso varia de acordo com os horários e os dias, mas na semana de 24 a 31 de março foram 645 casos, cerca de 92 por dia, conforme apontam os organizadores.

​Representantes do UNICEF afirmam que todo o atendimento é feito via chat por meio do site podefalar.org.br ou do número de WhatsApp (61) 9660-8843. A média das escutas é de 50 minutos, que pode se estender conforme a necessidade. O atendimento é pontual e busca realizar um acolhimento que alivie o usuário, por meio de uma escuta sem julgamentos, em que a pessoa fala sobre seus sentimentos e vai identificando os recursos com os quais conta para lidar com a situação.

A reportagem do portal Aqui verificou o serviço em uma sexta-feira (1/04), com ajuda de um adolescente de 13 anos para compreender o mecanismo de acolhimento. Ele acessou o Whatsapp do projeto e depois de responder a um breve questionário seguiria para falar com um atendente. No entanto, no horário não conseguiu atendimento porque já havia uma fila de espera, conforme a mensagem abaixo:

Assim que justificaram, rapidamente, o jovem foi encaminhado para várias outras instituições de acolhimento virtual que integram o Pode Falar, entre elas, o CVV com atendimento gratuito pelo telefone 188. 

Ajuda do “PODE FALAR”

A aluna de psicologia da Universidade Federal de Pernambuco, Ana Beatriz Gomes, de 22 anos,  viu que seu potencial como estudante de psicologia não poderia ficar parado e resolveu agir. Pelo menos duas vezes por semana, Ana e outros estudantes e profissionais da saúde mental acessam o canal de ajuda virtual. O trabalho dela, é escutar e acolher meninos e meninas em busca de alguém para desabafar. E isso vale para o Brasil inteiro!

Em geral, os atendentes se apresentam e dizem o que a pessoa gostaria de contar sobre o que está passando, quais são suas angústias e o que as levou a procurarem ajuda. ​”Hoje o Pode Falar possui uma equipe de 40 atendentes, incluindo profissionais e estudantes de pós-graduação de diversas áreas, incluindo psicologia, educação, assistência social, entre outras. 

Todos os atendentes passaram por uma formação específica sobre saúde mental, adolescências e juventudes conduzida pelo Núcleo do Cuidado Humano da Universidade Federal Rural de Pernambuco. A iniciativa trabalha com um modelo multidisciplinar que não é terapia, mas sim uma escuta acolhedora e sem julgamento, de forma similar ao trabalho do Centro de Valorização da Vida (CVV), mas com a especificidade de atender apenas adolescentes e jovens”, afirmam os coordenadores do Pode Falar.

O serviço é restrito para cidadãos entre 13 e 24 anos de idade e, segundo os organizadores, os principais relatos são de sentimentos de ansiedade, conflito e falta de diálogo com a família, sofrimento com a pressão nos estudos e no mercado de trabalho, automutilação, e casos de vulnerabilidade social, em que questões de raça, gênero, situação econômica da família e outras, geram impactos sobre a saúde mental dos adolescentes e jovens.

Diante dos casos, há direcionamento  para atendimento psicológico e, em algumas situações, é necessário um encaminhamento diferenciado em situações de abuso e violência dentro de casa. ​ “Em casos de ameaça à integridade dos adolescentes, os atendentes do Pode Falar solicitam as informações necessárias para encaminhar os jovens aos serviços do Sistema de Garantia dos Direitos das Crianças e Adolescentes, como o Conselho Tutelar ou o serviço de saúde (como o SAMU).  Os atendentes são orientados especificamente sobre esses casos e contam com o apoio dos supervisores e a retaguarda dos Conselhos Tutelares de todo país para acionar as redes de garantias’, asseguram representantes do UNICEF Brasil. 

Um dos depoimentos que está no site do projeto é de um adolescente de 15 anos, que não vamos identificar em respeito ao Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA). O jovem conta: “Em janeiro de 2021, perdi meu pai. Ele era a minha base e o meu mundo. Eu sei que no começo a dor é enorme, mas a ajuda da família e dos amigos é bem importante para superar isso. Eu pensei por vários momentos em desistir, mas não iria valer a pena. O importante é você pensar nos momentos bons e olhar para frente, tentar viver uma vida feliz, sair com os amigos ou procurar novos, fazer atividades ou mesmo um hobby que você gosta. A vida é linda demais para você desistir. Se alguém importante foi embora, lembre-se que essa pessoa iria querer você bem!”

Sobre o Pode Falar

O Pode Falar funciona de forma anônima e de graça por meio de um chatbot que pode ser acessado no site podefalar.org.br.

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