Colunistas
Na prática, o discurso é outro
Compliance, business plan, case de sucesso, Chief Executive Officer (CEO), mindset, expertise. Palavras e expressões adoradas no mundo corporativo passaram a fazer parte do universo futebolístico nos últimos anos, o que se intensificou com o advento das Sociedades Anônimas do Futebol (SAF).
Tudo muito bonito, muito bacana, sempre bom buscar os melhores métodos administrativos para lidar com orçamentos milionários, como os dos grandes clubes brasileiros. Mas os diplomas obtidos em faculdades no exterior não impedem os atuais dirigentes de repetir velhas práticas da cartolagem raiz.
Quando assumiram o Cruzeiro, Ronaldo Nazário e os sócios dele falaram em uma nova era no clube, muito mais profissional, em que orçamento e planejamento seriam cumpridos à risca, sem influência de conselheiros, medo de pressão de torcida ou intempestividade em caso de resultados inesperados. Com a terceira troca de treinador em oito meses, porém, fica claro que nada mudou em relação ao período da associação, que sempre foi gerida por amadores, muitos apaixonados pela instituição, mas amadores.
Se antes havia a acusação de que os dirigentes tomavam decisões irresponsáveis ou precipitadas porque o dinheiro não saía da conta deles, nada mudou com o clube tendo “dono”. Ou alguém esperava que o trabalho de Zé Ricardo fosse muito melhor que o de Pepa?
A situação fica ainda mais estranha porque até hoje não explicaram porque iniciaram a temporada com um treinador que não queria ficar, no caso, Paulo Pezzolano. Quando foram buscar um substituto, outra promessa foi quebrada. Afinal, a única coisa em comum do técnico campeão da Série B em 2023 com Pepa parece ser o fato de ambos serem estrangeiros. Na forma de pensar futebol, há grande distância.
O português arrancou bem, o time acumulou gordura com resultados importantes. Depois, os resultados não foram os desejados, é verdade, mas ao menos a equipe criava bastante e não ganhou vários jogos pelos erros incríveis de finalização.
Exatamente como os velhos “cartolas”, a turma do Fenômeno optou pela demissão do treinador. E contrataram um substituto, Zé Ricardo, que novamente em nada se assemelhava ao antecessor. Aliás, eu nunca soube exatamente o que o agora ex-treinador celeste pensa sobre futebol ou como ele gosta que suas equipes joguem.
O certo é que ele foi demitido apenas dois meses – e 10 jogos – depois de assumir o cargo. Nada mais amador, ou menos profissional, se preferirem.
Essa falta de sintonia entre discurso e prática nem é privilégio da diretoria do Cruzeiro. Outros clubes que têm o futebol gerido por SAF também meteram os pés pelas mãos durante a temporada. Um deles é o Botafogo, que vê a taça do Campeonato Brasileiro escapar por entre os dedos depois da saída de Luís Castro.
Ver John Textor na beira do gramado do Engenhão depois da derrota para o Palmeiras, por 4 a 3, de virada, reclamando da arbitragem, acusando a arbitragem de roubo e pedindo a renúncia do presidente da CBF, só reforça a impressão que essa história de nova era, mais profissional, é balela. O norte-americano agiu exatamente como os apaixonados dirigentes amadores, assim como fez ao demitir Bruno Lage depois de 16 jogos.
Não existe fórmula no futebol. O que não dá é para tentarem vender a imagem de modernidade, mas lá dentro se comportarem exatamente da mesma forma das administrações do século passado.
SELEÇÃO
A Seleção Brasileira volta a se reunir esta semana para mais dois jogos pelas Eliminatórias Sul-Americanas para a Copa do Mundo de 2026. Se Fernando Diniz está de astral renovado depois de levar o Fluminense ao sonhado título da Copa Libertadores, terá de contornar a ausência do craque Neymar. Se o time vencer e, principalmente, convencer contra Colômbia e Argentina, o treinador mais uma vez calará os críticos ao seu trabalho, muitas vezes incompreendido.